quarta-feira, 29 de agosto de 2007

O silêncio

Sim, foi por mim que gritei, declamei, atirei frases em volta, cego de angústia e de revolta.
Foi em meu nome que fiz, a carvão, a sangue, a giz, sátiras e epigramas nas paredes que não vi serem necessárias e vós vedes.
Foi quando compreendi que nada me dariam do infinito que pedi, que ergui mais alto o meu grito e pedi mais infinito!
Eu, o meu eu rico de baixas e grandezas, eis a razão das épi trági-cómicas empresas que, sem rumo, levantei com sarcasmo, sonho, fumo...
O que buscava era, como qualquer, ter o que desejava, febres de mais, ânsias de altura e abismo, tinham raízes banalíssimas de egoísmo.
Que só por me ser vedado sair deste meu ser formal e condenado, erigi contra os céus o meu imenso engano de tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!
Senhor meu Deus em que não creio! Nu a teus pés, abro o meu seio, procurei fugir de mim, mas sei que sou meu exclusivo fim.
Sofro, assim, pelo que sou, sofro por este chão que aos pés se me pegou, sofro por não poder fugir, sofro por ter prazer em me acusar e me exibir!
Senhor meu Deus em que não creio, porque és minha criação! Deus, para mim, sou eu chegado à perfeição... Senhor dá-me o poder de estar calado, quieto, maniatado, iluminado.
Se os gestos e as palavras que sonhei, nunca os usei nem usarei, se nada do que levo a efeito vale, que eu me não mova! que eu não fale! Ah! também sei que, trabalhando só por mim, era por um de nós.
E assim, neste meu vão assalto a nem sei que felicidade, lutava um homem pela humanidade.
Mas o meu sonho megalómano é maior do que a própria imensa dor de compreender como é egoísta a minha máxima conquista...
Senhor! que nunca mais meus versos ávidos e impuros me rasguem! e meus lábios cerrarão como dois muros, e o meu silêncio, como incenso, atingir-te-á, e sobre mim de novo descerá... sim, descerá da tua mão compadecida, meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida.
E uma terra sem flor e uma pedra sem nome saciarão a minha fome.
Adaptação do autor sobre a poesia de José Régio.

3 comentários:

Anónimo disse...

«Foi quando compreendi que nada me dariam do infinito que pedi, que ergui mais alto o meu grito e pedi mais infinito!»


http://www.youtube.com/watch?v=9t4gN_-nfQA

«...I will go east and go west
(to the places) from whence came
The moon and the sun
The moon and the sun will go...»
(excerto da letra - trd. do gaélico)


«La musique, le plus son après le silence.»

Maria disse...

"Olá Buda... Como estás Pest?", foi assim que me foi apresentada essa cidade de que tanto gostei e gosto!
Cheguei aqui pela mão de um amigo, hei-de voltar... fundo músical excelente, um todo muito agradável.
Felicidades.

james stuart disse...

Budapest é sem dúvida um encanto, para visitantes, para turistas...
Eu já aqui vivo há tanto tempo que dou por mim a não apreciar os objectos, os edifícios, o danúbio e tudo o mais que é tao belo.
Mas há aquele edifício, o parlamento que nunca me deixa indiferente, mesmo passando por ele todos os dias.
O infinito passa realmente finito quando encontramos esse infinito.
Entao pedimos mais, sonhando num infinito que novamente voltará a finito.
James Stuart vive nessa procura constante de infinito, que logo dá conta de ser tão breve finito também.