quinta-feira, 28 de junho de 2007

Silva Porto (3)

Mal se abriu a porta do Boeing 747 da TAAG, o bafo de ar quente e insuportável (a temperatura de Luanda pela madrugada), avisou o prelúdio de um dia memorável.
O aeroporto de Luanda é coisa pequena, entra-se a pé desde a pista para o terminal. Ainda de fora, os mosquitos rodam como loucos em volta das lâmpadas que aos poucos se apagam ao clarear do dia. No controlo dos passaportes, os funcionários não se inibem de pedir dinheiro (à recusa justificada de não possuir dólares consigo de momento, o funcionário oferece-se para abandonar o posto e acompanhar o visitante a uma caixa automática existente dentro do terminal). De bata branca, os "inspectores sanitários" conseguem ser mais audazes, solicitam os boletins de vacinas aos passageiros mesmo antes do controlo de passaportes (um infeliz lembrou-se de colocar o seu boletim dentro da mala de porão, assim não o pode disponibilizar antes do controlo, no entanto foi acreditado com uns 50 dólares de justificatvo).
Umas horas mais tarde, ainda no período da manhã, uma pequena aeronave (curiosamente o mesmo modelo de aeronave utilizado por Sá Carneiro e Amaro da Costa que resultou no fatídico acidente em Camarate) fez o trajecto Luanda-Kuíto. Os subúrbios de Luanda vistos do céu são algo incrível pela quantidade de barracas numa extensão seguramente dez vezes superior à área ocupada por Luanda (Esta capital tem uma capacidade imobiliária para uns 750 mil habitantes, todavia a população estimada é de 4,5 milhões).
A aeronave aproximava-se à pista do Kuíto quando um dos pilotos decide avisar os passageiros para não se preocuparem, que estão habituados a esta operação. O sentido dessas palavras só tem explicação alguns segundos depois, quando os passageiros conseguem vislumbrar através das janelas que a pista parece um “passador” recheadinha de buracos que obrigam os pilotos a um verdadeiro trabalho artístico de aterrar (os pilotos tombavam a aeronave em alta velocidade ora para a direita, ora para a esquerda, mas evitaram todas as crateras).
Há quem chame aquilo de aeroporto, mas o edifício está uma lástima, janelas partidas, vedação incompleta, canídeos solitários no interior e uma camioneta de caixa aberta para transportar bagagens e eventuais passageiros para a cidade. No exterior jazem blindados no meio do capim, onde as crianças brincam aos combates à falta de baloiços.
Sentado em caixa aberta, mas num Land-rover, as primeiras impressões da cidade foram tomadas. Descendo aquela larga avenida (ladeada pelo bairro do Cambulucuto, casas de adobe iguais às dos kimbos, mas com telhados de zinco), entroncamos com a estrada de ligação Kuíto-Huambo, viramos à direita (passando junto ao o campo do Sporting do Bié (em terra batida) e a poucas centenas de metros temos a entrada sul do Kuíto.
A zona urbana do Kuíto começa na verdade desde a rotunda ajardinada, onde está em funcionamento uma bomba de combustível (das três em funcionamento na cidade, todas da Sonangol). A avenida que parte desde a rotunda tem um canteiro central que mantém umas sebes e algumas árvores que lá vão sendo mantidas com orgulho e zelo. As bermas dos passeios, feitas em guias de betão, são pintadas com tinta de água na cor branca (somente dura até às primeiras chuvas, como é óbvio). Os passeios por toda a cidade estão bastante degradados à excepção daqueles na zona dos palácios e assembleia municipal, que foram feitos de calçada portuguesa.
Imagens captadas em 2004 no Cuíto (ou Kuito), antiga Silva Porto, província do Bié.

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