terça-feira, 24 de julho de 2007

Che Guevara, a realidade e o mito

Ernesto Guevara de la Serna nasceu a 14 de Junho (ou Maio) de 1928 na cidade industrial de Rosário, província de Santa Fé, Argentina.
Em 1932, seus pais Ernesto Lynch e Celia de la Serna y Llosa decidiram mudar-se para Altagracía, um lugar perto da cidade de Córdoba onde permaneceram até 1941.
A adolescência de Ernesto foi bastante atormentada por constantes ataques de asma que lhe perturbaram a educação e as actividades desportivas em que se envolveu com alguma seriedade.
Já a viver na cidade de Córdoba, a partir dos treze anos de idade, teve a facilidade de ler Júlio Verne, Pablo Neruda, Freud, Marx, Baudelaire, Engels, Dumas e Lenin entre os cerca de três mil livros que a família possuía em casa.
Em 1947, Ernesto ingressou na Faculdade de medicina da Universidade de Buenos Aires.
Sem ter finalizado os estudos, em 1952 realiza um passeio de oito meses pela América do Sul com o seu melhor amigo, Alberto Granados, percorrendo milhares de quilómetros num motociclo Norton 500. Essa viagem alegadamente transforma a percepção de Ernesto quanto à realidade política de seu país e vizinhos, constatando que as desigualdades e a injustiça social resultantes em pobreza extrema generalizada eram um flagelo da América latina, principalmente causado pelas ditaduras presentes.
Após conclusão dos estudos universitários, tendo sido convocado para o serviço militar na Argentina de Perón, simulou o agravamento da sua doença asmática de modo a ser dispensado como inapto.
Já com intentos de se envolver em política, em 1953 viajou para a Bolívia e depois seguiu para Guatemala com seu novo amigo Ricardo Rojo. Foi lá que Ernesto conheceu sua futura esposa, a peruana Hilda Gadea Acosta e Ñico Lopez, que futuramente o apresentaria a Raúl Castro no México. Em Guatemala, Dezembro de 1953, o presidente esquerdista popular Jacob Arbenz Guzmán procedia a uma ousada reforma agrária, numa tentativa de eliminar os latifúndios e diminuir as desigualdades sociais. O governo americano em desacordo e cuidando dos interesses económicos das suas empresas estabelecidas no território, através da CIA coordenou diversas acções de oposição, apoiando grupos paramilitares e provocando instabilidade suficiente que resultou num golpe de estado precedido por uma ditadura militar pró-americana. Assistindo a tudo isso, Ernesto Guevara toma uma posição definida na sua consciência, a luta contra o imperialismo americano e o espírito revolucionário passa a dominar a sua personalidade.
Inconformado com a ditadura guatemalteca, Guevara mudou-se para o México em 1954. Na capital deu aulas numa universidade e trabalhou no Hospital geral da Ciudad de México, onde reencontrou Ñico Lopez, que o levou ao encontro de Raúl Castro.
Raúl Castro encontrava-se no México como refugiado da fracassada tentativa de revolução de 1953 em Cuba. Raúl apresentou Ernesto a seu irmão mais velho Fidel que, do mesmo modo, se tornaram amigos.
Fidel Castro organizou e liderou o M26 (Martí 26 de Julio), um movimento guerrilheiro que tinha como objectivo tomar o poder em Cuba. Ernesto Guevara fez parte dos 82 homens que partiram para Cuba em 1956 sob o comando de Fidel Castro. Refugiaram-se na serra Maestra e após muitas acções de guerrilha organizaram um exército rebelde que derrubou o governo de Fulgêncio Baptista em 1959.
Depois da vitória, em 1959, Ernesto Guevara tornou-se cidadão cubano e o segundo homem mais poderoso de Cuba, Embaixador, Presidente do Banco Nacional e Ministro da Indústria.
Convicto das ideologias Marxistas-leninistas, terá apoiado a adesão do governo de Fidel Castro ao bloco soviético e fomentado o clima de confronto deste novo governo com os Estados Unidos.
Porque ser revolucionário é defender teorias que depois não são possíveis de praticar quando há que administrar os poderes e gerir a economia de um país (As teorias de Marx e Engels são muito coerentes enquanto teorias), Ernesto Guevara abandona o poder em Cuba no intento de repercurtir e estender a revolução de que fez parte a todos os países da América latina e África.
Em 1964 tentou uma revolta na Argentina, porém seu grupo foi antecipadamente descoberto, a maioria dos apoiantes capturados e mortos.
Em 1965 voltou a ser mal-sucedido no Congo Belga, que após a retirada dos colonos europeus, e a desmobilização das tropas da ONU no território (que seguravam o governo de Joseph Kasavubu contra as rebeliões lideradas por Moise Tshombe, pró-americano e pró-belga), um golpe liderado por Mobutu Joseph Desiré (Mobutu Sese Seko Koko Ngbendu wa za Banga) nesse mesmo ano tornou o Zaire (nome do país a partir de 1971) numa ditadura personalista, capitalista e anti-cristã.
Disfarçado de economista uruguaio, Ernesto Guevara entrou na Bolívia (sem a barba e a boina de estilo) em novembro de 1966.
Sem compreender a dimensão da realidade, sem perceber que a sua ideologia libertadora havia até ao momento resultado em demasiada violência e morte (dos actos de guerrilha, das punições justiceiras arbitrárias e execuções sumárias, próprias de revoluções ou tentativas de revolução) atrás de si e em parte por sua causa, planeou uma acção megalómana de revolução e unificação continental, preparando voluntários bolivianos, cubanos, argentinos e peruanos desde um campo de guerrilheiros no deserto do sudeste da Bolívia.
Ernesto Guevara foi capturado em 8 de outubro de 1967 em La Higuera, perto de Vallegrande e executado a tiro no dia seguinte pelos Rangers do exército Boliviano (estes treinados nos Estados Unidos) na mesma aldeia, dentro de uma escola.
Sua morte, no dia 9 de outubro de 1967, aos 39 anos, interrompeu o sonho de estender a Revolução Cubana à América Latina, porém transformou El Che num mito, símbolo de resistência, seja ela qual fôr. O modo como morreu, assassinado, fez de Guevara um mártir, um herói incondicional, independentemente da conformidade de seu passado.
Tal como aconteceu com Sven Olof Palme, Anwar Al Sadat, John Kennedy, Humberto Delgado ou Francisco Sá Carneiro o término abrupto das suas carreiras “apagou” imediatamente as suas eventuais falhas ou insucessos, glorificando e redesenhando a imagem das suas personalidades para um estatuto heróico.
Ernesto Guevara, se não tivesse sido assassinado, diferente de Fidel Castro, seria provavelmente considerado hoje em dia como um terrorista de ameaça global e nunca como um guerrilheiro revolucionário.
A imagem mais famosa de Che Guevara é o desenho do seu busto em alto contraste a preto e branco ou a preto e vermelho, da autoria do artista irlandês Jim Fitzpatrick (um estilo vulgarizado posteriormente por Andy Warhol), baseado na foto original (invertida) de Alberto Korda, captada em Março de 1960 num funeral em Cuba (o fotógrafo prescindiu de reservar direitos de autor).
Da fotografia para o desenho, perdeu-se a concepção humana do indivíduo, a fragilidade de um olhar preocupado e incompreendido.

4 comentários:

Menina Marota disse...

Por vezes os GRANDES sonhos, esbarram no oportunismo de alguns. Che, foi sem dúvida um sonhador, mas que, não conseguiu concretizar o seu sonho, antes pelo contrário, muitas mortes foram causadas por eles.

Sobre o seu pedido, se me quiser enviar endereço de email, terei muito gosto em lhe enviar os códigos de htlm, para colocação da música, tal como está no meu blogue. Por aqui, não é possível.

Um abraço ;))

LeonorBarros disse...

Partilho com ele a data de aniversário :-)

Unknown disse...

Caro James

Muito bom!Texto esclarecido, dismistificador, respeitoso e desapaixonado! Boa biografia resumida!

Arrefecer os mitos é preciso!

Abraço

Escritora disse...

Bonito texto!!!